O especialista em cinema Nelson Machado Filho, de Amparo, conta em sua crônica semanal “Filmes que o Tempo Levou” a história do filme “O Mundo do Circo” e a importância da obra da sétima arte para sua infância.
“Filmes que o Tempo Levou” apresenta: “O Mundo do Circo”
Por Nelson Machado Filho
Especial para o Rota das Águas
Meus pais foram ótimos e me proporcionaram uma infância extremamente feliz. Tanto é assim que eu não queria ter deixado de ser criança nunca. E uma das coisas mais gostosas de minha infância era quando chegava um circo na cidade.
Para mim a coisa mais linda era a paisagem dos circos com as suas tendas iluminadas. Era uma magia indescritível. No mundo do circo tudo era diferente e eu vibrava com muita alegria com as dançarinas, o salto triplo dos trapezistas, o globo da morte e o rugido dos leões.
Naqueles tempos a maioria dos circos que chegavam, ocupavam uma área onde hoje existe o Fórum da Comarca de Amparo, na Praça da Bandeira. Depois, com a construção do prédio do Fórum, eles passaram a ocupar num primeiro momento a Rua Comendador Guimarães, esquina com a Manoel Heitor, onde hoje tem um aglomerado de lojas próximo ao Supermercado Guarani. Em seguida eles passaram a ocupar a Praça Jorge Pires de Godoy.
Lembro-me de ver o filme “O Mundo do Circo” em 1965 no Cine Amparo, precisamente dia 15 de agosto, um domingo na matinê. Foi um domingo perfeito. Embora não ser considerado um clássico pelos especialistas, “O Mundo do Circo” nos remete a um período de bom entretenimento e grandes recordações.
Sinopse e comentários
John Wayne vive Matt Masters, um empresário norte-americano que leva seu circo por uma grande turnê pela Europa. Além de promover o espetáculo e tentar sanar os problemas dos componentes da equipe, ele tem uma outra tarefa importante a cumprir. A de tentar encontrar a ex-mulher, Lili (Rita Hayworth), que o abandonara anos antes, deixando a filha do casal, Toni (Claudia Cardinale) para ele criar.
Este filme é uma fascinante história de tristeza e felicidade, camaradagem e bravura. Nunca o cinema apresentara tamanhas acrobacias numa produção tão completa. Uma grandiosa e emocionante história da vida no circo.
À frente de um elenco primoroso e todo composto de estrelas – Rita Hayworth (1918-1987), Claudia Cardinale, Lloyd Nolan (1902-1985) e Richard Conte (1914-1975) – cintila o magnetismo de John Wayne (1907-1979).
Ele já sofria de câncer pulmonar, que seria logo diagnosticado após o término das filmagens. No outono de 1964, Wayne se submeteria a uma cirurgia para extirpar um dos pulmões, mas continuou ativo praticamente até a morte, 15 anos depois.
O enredo tem uma história de desencontros amorosos e familiares com o circo como pano de fundo, envolvendo uma tragédia que estimula a todos os personagens na famosa tradição de que o show deve continuar.
Durante as filmagens de “O Mundo do Circo”, John Wayne quase morreu nas cenas de um incêndio no circo, quando o set em chamas caiu muito próximo dele, devido a uma falha de comunicação entre a equipe de efeitos especiais.
O filme é frequentemente comparado a “O Maior Espetáculo da Terra”, de Cecil B. DeMille, e também confundido com “Trapézio”, estrelado por Burt Lancaster, Tony Curtis e Gina Lolobrígida.
Foi rodado pelo processo Super Technirama 70 e lançado em Cinerama nos cinemas, onde isso era possível. A obra recebeu um Globo de Ouro pela canção homônima, composta por Dimitri Tiomkin e Ned Washington.
Rita Hayworth faz a mãe de Claudia Cardinale e ela concorreu ao Globo de Ouro pelo papel. A eterna Gilda, aos 46 anos, ainda esbanjava beleza, se tornando mais humana e melhor atriz com o tempo.
Muito embora seja penoso pensar que grande parte de suas atuações de qualidade foram motivadas por seu alcoolismo. Já nessa época, a atriz já vinha sofrendo os primeiros sintomas do Mal de Alzheimer, doença que a mataria em 1987.
Originalmente, esse era um filme que deveria ser dirigido por Frank Capra. Mas ele se retirou do set após desentendimentos com John Wayne e parte da comitiva pessoal do ator. Coube então a Henry Hathaway continuar os trabalhos de direção.
“O Mundo do Circo” consumiu vários milhões de dólares na produção e fabulosas verbas de publicidade no seu lançamento, mas os resultados foram desastrosos, de proporções irreparáveis.
Quando o filme foi lançado, havia na televisão uma série no horário nobre chamada “O Fabuloso Mundo do Circo”, apresentado por Don Ameche, onde ele exibia os maiores astros do mundo circense. Aqui no Brasil a série foi exibida ás sextas-feiras na antiga TV Paulista Canal 5.
E no sábado, por volta das 19h, na TV Record, era exibida outra série sobre o mundo dos circos. Chamava-se “Circo Sem Fronteiras”, onde um dos atores principais era John Derek.
Certamente não foi um incentivo para as pessoas verem este filme no cinema quando podiam ver a mesma coisa em casa na TV. Também, a Paramount relançou “O Maior Espetáculo da Terra”, de Cecil B. DeMille, que rendeu uma boa bilheteria ao mesmo tempo em que “O Mundo do Circo” foi lançado.
E juntamente com sua outra megaprodução-irmã, o produtor Samuel Bronston, lançou na mesma época “A Queda do Império Romano”, que serviu para afundar a produtora espanhola de quatro anos do produtor e o fez encerrar sua carreira bastante curta como magnata do cinema.
Nesses quatro anos, ele produziu, além dos dois filmes já mencionados, “O Rei dos Reis”, “55 Dias em Pequim” e “El Cid”. Nenhum produtor independente jamais tentou um empreendimento tão ambicioso, o que tornou o fracasso de Bronston talvez ainda mais espetacular do que os filmes que ele lançou.
Por todas essas razões, o “Mundo do Circo” fracassou e faliu o produtor Samuel Bronston. No entanto, como fã de John Wayne e de circo, eu particularmente gosto muito de revê-lo, o que já aconteceu muitas vezes.
Tem uma ótima fotografia, efeitos, figurinos e cenários incrivelmente eficazes. Existem também algumas cenas que particularmente dignas de nota. Uma delas é a do incêndio que destrói todo o circo, o desastre do navio que deveria levar o circo para a Europa, e os malabarismos de Cláudia Cardinale e Rita Haywworth no picadeiro.
As cenas são cheias de emoção e muita tensão. Rita Hayworth e Claudia Cardinale são adoráveis e cativantes. Juntas, elas são ainda melhores. Neste filme elas parecem estar disputando quem é a melhor em ofuscar uma a outra, e é muito divertido assistir.
Ficha Técnica
Filme – “O Mundo do Circo”
Lançamento – Paramount Pictures
Ano –1964
Direção – Henry Hathaway
Elenco – John Wayne, Rita Hayworth, Claudia Cardinale, Lloyd Nolan, Ricard Conte e John Smith
Produção – Samuel Bronston
Roteiro – Ben Hecth, James Edward Grant e Julian Zimet
Trilha sonora – Dimitri Tiomkin
Fotografia – Jack Hildyard e Claude Renoir (em cores)