Encontrar o significado exato da representatividade da presença do pianista e maestro João Carlos Martins na noite de sábado (12), na estância de Monte Alegre do Sul, supera os limites da imaginação ou do achismo.
Está guardado no íntimo de cada morador, de cada turista e de cada fã que comparecer à Praça Bom Jesus, no coração do Centro Histórico da conhecida “Pérola” do Circuito das Águas Paulista.
De concreto mesmo, é a certeza de que o espaço será totalmente tomado por um público ciente que à sua frente estará a maior referência brasileira da música erudita para um concerto de nível internacional.
João Carlos Martins, às vésperas de ver sua vitoriosa história de vida chegar ao cinema com o filme “João, o Maestro”, com lançamento confirmado para o dia 17 de agosto, sobe ao palco às 20h acompanhado pela Orquestra Camerata Bachiana.
Juntos exibem um repertório que homenageia o maestro e compositor brasileiro Heitor Villa-Lobos (1887-1959). O espetáculo “Na Roda com o Maestro – Uma homenagem a Heitor Villa-Lobos” é único, imperdível e inédito na cidade de pouco mais de 7 mil pessoas. A entrada é gratuita.
A vinda de Martins e da orquestra a Monte Alegre do Sul faz parte do Circuito CPFL de Arte e Cultura, viabilizado pelo Programa de Ação Cultural (ProAc), do governo do Estado.
Uma vida de superação
Nascido em São Paulo, 25 de junho de 1940, João Carlos Gandra da Silva Martins, começou a estudar piano aos 8 anos de idade no Liceu Pasteur. Sua fama ganhou o mundo ainda na adolescência pela interpretação das obras de Johann Sebastian Bach (1685-1750).
Mas a prova maior de seu talento veio na estreia no Carnegie Hall, casa de espetáculos na Midtown Manhattan, na altura do número 881 na Sétima Avenida, em Nova Iorque (EUA), aos 21 anos. O espaço estava lotado, assim como deve estar a Praça Bom Jesus, em Monte Alegre do Sul, na noite de sábado.
Martins tocou com as principais orquestras americanas e gravou no piano a obra completa de Bach. Mas a vida que lhe rendeu fama, também colocou pedras em seu caminho.
Como brasileiro, apaixonado pelo futebol, sofreu uma contusão durante uma “pelada” em pleno Central Park em 1966.
Caiu sobre uma pedra e feriu o nervo ulnar, na altura do cotovelo. Isso lhe causou atrofia em três dedos da mão. A contusão se agravou e em 1970 abandonou pela primeira vez a carreira de pianista.
Foram anos de fisioterapia e em 78 voltou a tocar até que outra contusão na mão direita o obrigou a parar novamente em 1985. Guerreiro, Martins não desistiu, continuou a luta até voltar em 1993.
Quando estava em Sófia, na Bulgária, em 1995, levou uma pancada na cabeça durante assalto. O resultado foi uma nova lesão, só que desta vez na mão esquerda.
Cirurgias e fisioterapia voltaram a fazer parte do cotidiano do pianista. Mas as dores se tornaram insuportáveis. Um tumor na mão esquerda e a doença de Dupuytren, que impede que os dedos sejam estendidos, também comprometeram a carreira de Martins.
Depois de tantos problemas e mais de 20 cirurgias, o pianista passou a reger. Devido à dificuldade de coordenação dos movimentos de seus dedos, João Carlos Martins é incapaz de segurar a batuta e virar as páginas dos concertos.
Para não interromper a execução da música, ele memoriza nota por nota. Todas as músicas que rege são decoradas. Toda sua luta aos longos destes 77 anos transformou-o em exemplo de superação e de vida.
Mas a história não havia acabado. João Carlos Martins fundou a Filarmônica Bachiana Jovem em 2006 e hoje é regente e diretor-artístico da Bachiana Filarmônica Sesi-SP, que se apresentou pela primeira vez em 2004, em São Paulo. Depois disso, esteve nas principais salas do Brasil e do mundo.
Antes de sua apresentação inédita em Monte Alegre do Sul, o consagrado maestro gentilmente dedicou alguns minutos para atender o Rota das Águas e fez questão de convidar a todos para o concerto do sábado.
“É minha primeira passagem na cidade, estou com a expectativa muito boa. Com certeza vai ser ótimo!”, diz.
Rota das Águas – Desde o início da carreira, o senhor executa obras do compositor Johann Sebastian Bach. Assim como ele, o senhor tem um conhecimento vasto sobre música e se tornou um regente. Claro que existiu uma história para que essa transição acontecesse, mas podemos dizer que Bach também o influenciou?
João Carlos Martins – A minha ida pra a regência foi fruto de um sonho que tive com o maestro Eleazar de Carvalho, que me recomendou estudar regência. Depois daquele sonho, no dia seguinte, o maestro Júlio Medaglia me deu a primeira aula de regência. Eu já tinha 63 para 64 anos quando comecei a estudar. No início, foi devastadora a interrupção da carreira como pianista, mas o que prevaleceu foi, apesar de alguns percalços, o amor à vida e antes de tudo o amor à música.
E por que Bach?
João Carlos Martins – Considero Bach o maior compositor de todos os tempos. A importância dele em minha carreira se dá desde o meu primeiro concurso que participei, aos 8 anos, que ganhei tocando obras de Bach. Desde então a admiração só cresceu.
O filme “João, o Maestro” tem lançamento previsto para a segunda quinzena de agosto. O senhor já assistiu ao filme?
João Carlos Martins – O lançamento do filme será dia 17 de agosto. Assisti sim, acho que foi um trabalho incrível do diretor Mauro Lima e de todo o elenco, sem exceção. Alexandre Nero, Rodrigo Pandolfo e o jovem Davi Campolongo foram extraordinários representando as fases da minha vida. Na parte musical o filme é fiel, mas na área particular é baseado na minha vida.
O senhor é um exemplo de inteligência, talento e superação. Tais características já seriam uma influência para inúmeras gerações futuras, mas o senhor disse que gostaria de ser conhecido pela democratização da música clássica de alta qualidade. O espetáculo que o senhor apresenta em Monte Alegre do Sul tem a mesma proposta, não?
João Carlos Martins – Com certeza! É mais um passo para este projeto e sonho que tenho, de democratizar a música clássica, para que todos tenham acesso. Continuo profundamente empenhado em realizar o sonho de Villa Lobos, de fechar o Brasil em forma de coração.
A apresentação também tem proximidade com o projeto “Concertos Clássicos”. Podemos dizer que o espetáculo “Na Roda com o Maestro” é uma extensão da missão da Orquestra Bachiana?
João Carlos Martins – Sim. Nossa missão é atingir essa democratização e que as pessoas tenham acesso à música clássica, assim como de outras artes. A arte, no geral, tem um efeito transformador em pessoas de qualquer idade e, certamente, pode ajudar os jovens a encontrar seu caminho, sendo um segmento importante para a inclusão social.
O senhor conhece Monte Alegre do Sul? Já se apresentou em alguma cidade dos Circuito das Águas Paulista?João Carlos Martins – Minha primeira passagem na cidade, estou com a expectativa muito boa. Com certeza vai ser ótimo! Já estive sim em outra cidade do Circuito. Recentemente, Holambra, onde fui muito bem recebido. Aguardo todos vocês para uma linda apresentação.